jueves, 1 de agosto de 2013

joao batista de matos Fundação Kissama

joao batista de matos Fundação Kissama

Caros amigos,
O Segundo trimester normalmente marca a transição da época chuvosa para o cacimbo. Nunca foi uma época favorita para mim, já que Abril tende a ser demasiado molhado e com terreno inundado, ao passo que em Maio e Junho o capim caduco torna-se dominante e começam as queimadas, tornando o trabalho de campo desconfortável e não muito produtivo. Nunca é uma boa época do ano para observar os animais já que a nossa mobilidade é reduzida e eles têm demasiada cobertura. Se isto não bastasse, as chuvas abundantes da época chuvosa que finalizava atrasaram a sequência normal dos acontecimentos em pelo menos um mês.

Até ao longo do mês de Junho, tivemos grande dificuldade em atravessar a baixa que define o limite ocidental do Parque da Cangandala. E sem surpresa, tivemos muito poucas observações de palancas a registar. O mais que conseguimos fazer, foi aproximar-nos algumas vezes da manada mais jovem, agora orgulhosamente controlada pelo magnífico Mercúrio (o primogénito da “nova” Cangandala). Tentativas de aproximação à manada maior, que inclui as fêmeas velhas e híbridos, não teve grande sucesso devido à natureza nervosa dos híbridos, vegetação densa e tornado pior devido à ausência do velho Duarte. Apesar dos nossos esforços não conseguimos detectar o seu sinal de rádio em nenhum local. Considerando a luta na vedação que foi reportada em finais de Março, receamos que já não tornaremos a ver o velho macho... Uma pena, já que ele tinha feito uma recuperação milagrosa depois do combate do ano passado, mas de qualquer forma também já estava a ficar demasiado velho.

Por outro lado o Ivan, como as câmaras ocultas confirmaram, parece tão forte como nunca e sem arranhões. O que nos preocupa, é que o Mercúrio possa ser o próximo na linha de sucessão sob o radar do Ivan, e mais cedo ou mais tarde possa ser desafiado para uma batalha... e não nos podemos dar ao luxo de perder o jovem Mercúrio!

A maior surpresa no santuário foi encontrarmos um casal de nunces. Ao longo das últimas décadas os nunces foram quase extirpados da Cangandala (muito embora no Luando sejam ainda hoje comuns), e a última observação tinha sido em 2009 numa baixa alagadiça mais a sul. Certamente que não esperávamos que qualquer nunce tivesse ficado dentro do perímetro da vedação, onde o habitat nem é o mais atractivo para esta espécie. Os nunces na região geralmente preferem zonas abertas extensas associadas com linhas de drenagem. Contudo, um olhar cuidado ao registo fotográfico, deu-nos algumas pistas sobre como lá terão ido parar. Sendo uma fêmea adulta e um macho bastante jovem, tudo indica tratar-se de mãe e filho. Um cenário provável seria a fêmea ter penetrado na mata para parir há um ano atrás, precisamente quando a vedação estava a ser expandida e como resultado acabou aprosionada dentro do santuário com a sua cria. Mesmo que o habitat não seja o seu preferido, estarão a salvo dentro do santuário, e agora terão a responsabilidade de repovoar a área!

Na reserve do Luando, as chuvas também foram generosas, mas o facto mais preocupante foram os registos insistentes de caça furtiva, transmitidos pelos pastores. A caça furtiva parece de facto estar intimamente ligada com várias operações de exploração diamantífera estabelecidas ao longo do rio Kwanza, já que estão na origem de uma demanda crescente por carne de caça, e isto ainda não foi solucionado. E claro está, caçadores bem armados, não apenas constituem uma ameaça permanente para as palancas, mas também colocam as vidas dos pastores em perigo. Alguns passos estão a ser dados para lidar com esta crise, e tenho esperança que possa produzir resultados em breve.


Best wishes,